terça-feira, janeiro 04, 2005

Caetano Veloso e o passado

Pra mim, a última novidade relevante do Caê veio de 2002. Ou seria de 1978? Trata-se de um show histórico realizado nesta época no Teatro Carlos Gomes, no lançamento do álbum "Bicho", onde Caetano foi acompanhado pela histórica Banda Black Rio. Essa gravação foi incluída na "impossível" caixa (1000 reais é dose!) com toda a discografia do mestre remasterizada pelo Charles Gavin, "Todo Caetano", lançada no final de 2002, mas só pude "pescá-la" na Internet há uns seis meses atrás. Para mim foi mais uma constatação de que a voz de Caetano era muito mais solta (ou sem freios?) e é evidente que ao longo dos anos ele passou a cantar muito melhor. O auxílio luxuoso da Banda Black Rio nos arranjos das músicas, os tornam quase irreconhecíveis e com uma verve samba-jazz, dão um novo sabor a clássicos como "Odara", "London, London" e "Alegria, Alegria". Além destes e alguns outros sucessos de Caê, temos várias músicas instrumentais chiquérrimas: "Maria Fumaça" e "Leblon Via Vaz Lobo", da BBR e algumas músicas nordestinas, como "Na Baixa Do Sapateiro", de Ary Barroso (gravada por Caetano em 96 no álbum "Livro") e "Baião", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.

Transa (1972) e Jóia (1975)
Eu achava os dois álbuns bem esquisitos há 13 anos atrás, mas hoje sinceramente acho que são bons discos. Com altos e baixos - como quase todos os discos dele até 77 - mas com jóias como You don’t know me, Nine out of ten, Mora na filosofia, Minha mulher, Lua lua lua lua e Canto do povo de um lugar. Já o Araçá Azul, de 1973, até hoje é dose de agüentar...

Aproveitando a carona, reproduzo a seguir uma resenha escrita originalmente em 08/06/2001

Noites Do Norte Ao Vivo (2000)
O espetáculo prometia radicalizar as experiências sonoras que marcaram a turnê anterior, “Livro Vivo”, que deo origem ao CD/DVD "Prenda Minha" (1998). Porém, Caetano teria dito ao violoncelista Jaques Morelenbaum que este show talvez não fosse tão interessante para ele como trabalho musical. “Mas Jaquinho não achou isso, fiquei honradíssimo de ele querer tocar comigo mais uma vez”, disse Caetano.

Apesar da filosofia do álbum “Noites do Norte”, que evoca ritmos africanos e uma dialética essencialmente associada à história do negro no Brasil, incluindo pensamentos do abolicionista Joaquim Nabuco, tais como “A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil”, incluído na faixa-título, o show traz algumas poucas canções que poderiam estar associadas com este conceito. “Zera A Reza”, “Cantiga De Boi” e sua versão de “Zumbi”, de Jorge Benjor, são alguns raros exemplos.

Na verdade, o aclamado “radicalismo sem virtuosismo” é seguido à risca por Caetano e seus músicos, que incluem, além do famigerado Jaques, os quase “teenagers” Davi Moraes e Pedro Sá levando as outras cordas (guitarras, baixo e bandolim) e cinco percussionistas, incluindo o ótimo (também baterista) Cesinha. Atirando para todos os lados, o tiro de Caetano sai, de fato, pela culatra. As músicas mais autorais (e menos conceituais) do CD (como “Tempestades Solares” ou “Cobra Coral”) perdem-se na estrutura do show, que privilegia a verve “pop” e “bossanovista” de Caetano, não abandonando a sua particular visão histórica de “quase clássicos” que sempre emociona.

Em algumas músicas a forte percussão chega a ofuscar o brilho da voz de Caetano; os minimalistas Davi Moraes e Pedro Sá deixam quase sempre as canções vazias e só acertam a mão roqueira nas músicas com uma verve mais simplista, como “Tropicália”, “Rock‘n’Raul”, “Haiti” e “Língua”. Até na sessão “banquinho, voz e violão”, Caetano bate na trave. “Araçá Azul”, apesar de agradável, está muito abaixo da média das composições do baiano. Por outro lado, a global “Samba de Verão” e a indefectível já-ouvimos-mais-de-12.345.657-vezes “Sozinho”, são, de fato, totalmente dispensáveis.

Na linha dos maiores sucessos, as fáceis “Nosso Estranho Amor”, “Tigresa” e “O Leãozinho” banalizam o set, que poderia ser salvo com a belíssima “Dom De Iludir”, mas que é contaminada no final ao ser arrematada com o “Funk do Tapinha”. Entretanto, “Magrelinha” (Luiz Melodia) é uma séria candidata a “Sozinho II, A Missão” e “O Último Romântico” (Lulu Santos) acompanhada somente pelo violoncelo têm muitas chances de tocar no rádio, sim.

Apesar de algumas distorções (literais ou não), nunca é demais ver o mestre Caetano (à beira dos sessenta!) tentando – e conseguindo – continuar a ser o sopro de leveza, maestria, técnica, criatividade e ousadia, que o tornou a estrela-mor da música brasileira (e mundial, por que não?).

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